quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

rasaltab

foi um gato
feito de amor.
dormia com o nariz a
tremer e deitava-se
sobre a folha em branco
para me inutilizar as palavras.
substituiu-se à caneta partida
enquanto os olhos vertiam
uma aurora pela noite dentro.
ensinou-me a sorrir em silêncio
e a guardar a vida toda
entre a retina e o esquecimento.
andava sobre a relva como
se flutuasse e gritava uma
voz estranha de criança
que foi, em tempos, o
que sobrou do meu tórax.
uma vibração constante;
o neutrino que sobe e
desce o universo pela
escada de emergência.
atravessa a cidade com
o cansaço apenas de
recordar o caminho
em chamas. a carne
como combustível
e o espelho do quarto
do avesso a guardar
a realidade:
o negativo de um
fausto poema
rasurado.


fui de um gato
que amou sem saber.
que dormiu e dançou
e soçobrou inconstante.
estilhaçou a poesia
[a sua utilidade ]
com a ausência de um corpo
que estremece
sobre uma folha em branco
vincada. 


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